Em 1959, Jonas Salk, o homem que descobriu a vacina contra a poliomielite, aproximou-se de Louis I. Kahn com um projeto. A cidade de La Jolla, na Califórnia, forneceu-lhe um local pitoresco ao longo da costa do Pacífico, onde Salk pretendia fundar e construir um centro de pesquisas biológicas. Salk, cuja vacina já havia tido um impacto profundo na prevenção da doença, estava convencido de que o projeto para essa nova instalação deveria explorar as implicações das ciências para a humanidade. Ele também tinha uma diretriz mais ampla, se não menos profunda, para o arquiteto escolhido: "criar uma instalação digna de uma visita de Picasso". O resultado foi o Instituto Salk, uma instalação elogiada por sua funcionalidade e estética impressionante - e a maneira pela qual cada um suporta o outro. [1,2]
Junto com essas instruções grandiosas, Salk estabeleceu uma série de requisitos mais práticos. Os espaços de laboratório nas novas instalações teriam que ser abertos, espaçosos e facilmente atualizados à medida que novas descobertas e tecnologias avançassem no curso da pesquisa científica. Toda a estrutura deveria ser simples e durável, exigindo manutenção mínima. Ao mesmo tempo, deveria ser brilhante e acolhedor - um ambiente inspirador para os pesquisadores que trabalhariam lá. [3]
O esquema de Kahn para o Instituto foi orquestrado espacialmente de maneira semelhante a um mosteiro: uma comunidade intelectual isolada. Três zonas deveriam ficar separadas, todas voltadas para o oceano a oeste: a Casa de Reuniões, a Vila e os laboratórios. A Casa de Reuniões seria um grande local de convívio e local para conferências, enquanto a Vila deveria ser provida de alojamentos; cada parte do complexo teria sido separada de seus vizinhos paralelos por um jardim de água. Por fim, a Casa de Reuniões e a Vila foram cortadas do projeto e apenas os laboratórios foram construídos. [4]
Os laboratórios do Instituto Salk, primeiro concebidos como um par de torres separadas por um jardim, evoluíram para dois blocos alongados, espelhando-se em torno de uma praça pavimentada. A quadra central é revestida por uma série de torres destacadas cujas saliências diagonais permitem janelas voltadas para o oeste sobre o oceano. Essas torres são conectadas aos blocos de laboratório retangulares por pequenas pontes, proporcionando passagem através das fendas das duas quadras afundadas que permitem que a luz natural penetre nos espaços de pesquisa abaixo. Kahn incluía esses pátios não apenas como poços de luz, mas como referências aos claustros do mosteiro de São Francisco de Assis - um exemplo pelo qual Salk anteriormente expressara sua admiração. [5,6]
Muitas das decisões projetuais que Kahn implementou no Instituto Salk derivaram das lições aprendidas durante seu trabalho nos Laboratórios de Pesquisa Médica Richards da Universidade da Pensilvânia. Questões com aglomeração nos Laboratórios Richards levaram ao layout mais aberto e desobstruído em Salk. Foi também na Pensilvânia que Kahn primeiro desenvolveu a noção de separar os espaços de pesquisa da infraestrutura de serviços públicos em diferentes pavimentos, uma inovação que seria aplicada de forma mais abrangente em seu projeto posterior. A alternância de níveis de laboratório e infraestrutura permite que a manutenção do edifício ocorra sem interromper a pesquisa realizada acima ou abaixo. [7]
Por instruções de Salk, Kahn também projetou os laboratórios de forma que seriam facilmente atualizados. As vigas de suporte estão restritas às bordas de cada laboratório, permitindo maior flexibilidade na reconfiguração do equipamento e dos espaços internos. Os sistemas mecânicos não são vedados atrás do concreto, mas atrás de paredes de blocos que podem ser removidas durante a manutenção e as reformas. As janelas dos laboratórios são fixadas no lugar por parafusos, permitindo que elas sejam temporariamente removidas para que grandes equipamentos possam ser movidos para dentro e para fora do prédio sem exigir que a estrutura seja demolida. O prédio é capaz de "adivinhar o amanhã", sugeriu Salk. em 1967. [8]
Os laboratórios são, por definição, espaços compartilhados e de colaboração espontânea; aqueles que procuram privacidade devem cruzar as passarelas em uma das dez torres que se alinham na praça central. As torres contêm pequenos áreas de estudos, com suas janelas voltadas para o oeste direcionando as vistas para a praça e o Oceano Pacífico além. [9] As extremidades ocidentais de ambas as alas de laboratório também são dedicadas a espaços de escritórios, sendo que tanto os escritórios quanto os locais de estudos têm vista para o mar. [10]
Entre as torres de estudo com espaçamento rítmico está uma extensão quase inexpressiva de pedra de travertino esbranquiçada. Kahn inicialmente planejava preencher o espaço com um jardim, mas foi convencido pelo arquiteto Luis Barragán a deixar o espaço como um vazio. [11] Um canal fino de água corta a praça, atraindo o olhar para o horizonte azul. O concreto inacabado que forma as paredes do Instituto é quase idêntico ao travertino na praça, dando ao espaço uma monumentalidade primitiva e quase sublime que sugere antigos antepassados romanos sem referência estilística direta. (A comparação é sugerida, no entanto, pela especificação de concreto pozolânico de Kahn - o mesmo tipo usado na construção romana.) Painéis de teca inseridos identificam os locais das janelas de estudo e de escritório, fornecendo o único alívio material do concreto monolítico e pedra usados em todo o Instituto. [12]
Nas cinco décadas que se passaram desde que o Instituto Salk abriu suas portas em 1965, a aparência externa da obra-prima de Kahn permanece praticamente inalterada. O concreto e a pedra resistiram quase inteiramente às intempéries do litoral, enquanto um esforço recente de preservação realizado pela Fundação Getty buscou consertar os painéis de teca, preservando 70% do material original. A previsão de Salk e Kahn no projeto dos laboratórios também permitiu que o Instituto continuasse sendo uma instalação funcional para pesquisas avançadas, que já recebeu a participação de seis ganhadores do Prêmio Nobel desde sua fundação. Com o seu projeto flexível e interação magistral de material e espaço, o Instituto Salk é susceptível de manter o seu significado como um centro de pesquisa e uma maravilha arquitetônica no futuro. [13]
Referências
[1] Miranda, Carolina A. "Louis Kahn's Salk Institute, the building that guesses tomorrow, is aging — very, very gracefully." Los Angeles Times. November 22, 2016. [link].
[2] Curtis, William J. R. Modern Architecture Since 1900. London: Phaidon Press, 2013. p522.
[3] "About Salk Architecture." Salk Institute for Biological Studies. Accessed August 11, 2017. [link].
[4] Curtis, p522.
[5] Weston, Richard. Key Buildings of the Twentieth Century: Plans, Sections and Elevations. London: Laurence King, 2004. p138.
[6] Gast, Klaus-Peter, Susanne Schindler, and Louis I. Kahn. Louis I. Kahn. Basel: Birkhäuser Verlag, 1999. p64.
[7] Miranda.
[8] Miranda.
[9] Curtis, p522.
[10] “About Salk Architecture.”
[11] Curtis, p522-523.
[12] “About Salk Architecture.”
[13] Miranda.
- Ano: 1965
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Fotografias:Liao Yusheng
Light Matters: Louis Kahn e o Poder da Sombra
Light matters, uma coluna mensal que trata da luz e do espaço, é escrita por Thomas Schielke. Fascinado pela luz na arquitetura, já publicou inúmeros artigos e assina a co-autoria do livro "Light Perspectives". A sombra tem o poder de dar forma à arquitetura?
Vídeo: Explore o icônico Salk Institute, de Louis Kahn
Ver o nascer do sol no Salk Intitute for Biological Sciences de Louis Kahn é, sem dúvida, uma das experiências arquitetônicas mais transformadoras. O famoso edifício, cenário de muitos filmes e ensaios fotográficos, se tornou um símbolo de serenidade na arquitetura graças a sua impressionante simetria, uma qualidade superada apenas por sua belíssima localização com vistas para San Diego, Califórnia.